segunda-feira, 19 de março de 2012

Como os nossos pais




Elis Regina morreu aos 36 anos. Lembro-me daquele 19 de janeiro de 1982 como se fosse hoje. Mas, confesso, passados 30 anos, fico impressionado como a diva da MPB parecia tão mais madura nos seus últimos momentos.  Elis fez parte de uma geração de mulheres que aceitava o tempo, suas marcas, seus efeitos...

A Pimentinha cantou seu hoje, suas dores, seus sonhos. Defendeu a liberdade, gritou pelo direito de ser mulher, de viver e transformar!  Herdeira das vozes do rádio, Elis cantava firme para o futuro, sem esperar resposta.

Quando cantou Atrás da Porta, de Chico Buarque, mesclando a voz mais afinada de todos os tempos com o seu pranto mais honesto, não estava preocupada com rugas e nem com as marcas de expressão! Pelo contrário: expressão era seu nome e sobrenome!

Custo a entender o que faz uma mulher expor o próprio rosto a uma intervenção cirúrgica, após os 40 ou 50 anos de vida. Aquela figura que surgiu anos a fio diante do espelho toda a manhã, de uma hora para outra, passa a ser outra, esticada, esturricada, modificada!

E o tal do botox? Está produzindo um país de criaturas congeladas. Mulheres que não modificam a expressão nem quando riem, tampouco quando choram. Que não expressam curiosidade para não enrugar a testa. Que escondem o que sentem para sair bem na foto.

Alguém precisa dizer que essas senhoras que desfilam as faces botocadas pelas páginas da Caras são feias, tristes e fisicamente desonestas!

Sim, isso mesmo, essa é uma questão de honestidade!

Quero uma mulher capaz de demonstrar o que sente. Quero saber pelo canto do seu olho, pelas linhas da sua face, que o meu amor está feliz ou triste.

Quero poder reagir e cobrir minha amada de flores e carinhos para depois, perceber aos poucos, com a sua expressão mais honesta, a mudança do seu estado de espírito.

Quero acordar ao lado de uma mulher cujo corpo testemunhou o tempo passar.  Quero envelhecer ao lado de alguém que, como eu, simples e dignamente, envelheceu!

Quero ouvir ao seu lado a voz de Elis profetizando que, apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais!


4 comentários:

  1. MAIS UMA VEZ....PERFEITO!! VALEU RONALD!!

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  2. Muito bom , Ronald. Você tem razão: alguém tem que dizer pras botocadas que elas estão feias na revista Caras...Bjão!

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