Em um reino muito, muito distante havia um boneco de pau
chamado Pinóquio. Seu sonho era virar um menino de verdade.
Boneco de periferia, viu seus amiguinhos humanos crescerem.
Pinóquio ficava pensando como seria bom sentir frio, calor, o sabor das frutas e
o cheiro da relva.
Aos 18 anos, o melhor amigo de Pinóquio financiou uma moto.
Começou a entregar pizzas e, nas horas vagas, fazer uma “correria” para os
“manos” da vila. Fugindo de uma viatura, caiu e quebrou uma perna e um braço e
ainda foi preso.
Pinóquio, assustado, desistiu do seu intento, com medo da
dor que o amigo sofrera. Mas uma fada ecológica surgiu sobre a cama do boneco e
sentenciou:
- Você foi feito de madeira nativa, devastando o meio
ambiente e não pode continuar assim, disse a fada, lançando o encanto com sua
varinha de led – que economiza energia.
Pronto. O boneco virou um marmanjo, equipado com carteira de
trabalho e hoje, tenta ganhar a vida naquele reino que, de tão, tão distante,
demanda três conduções para ir e duas para voltar do emprego que conseguiu em
uma vídeo locadora erótica no centro da cidade.
Em terras vizinhas, do mesmo reino, viviam três porquinhos
empreiteiros: Cícero, Heitor e Prático.
Cícero construía casas em áreas de manancial e vendia
baratinho para os súditos metidos a espertos. Heitor era agiota e emprestava
dinheiro para financiar as casas com juros abusivos. E Prático, honesto que só,
erguia uma casa por vez e vendia à vista, com dificuldade.
Em um dia frio, o Lobo fiscal chegou e pulou no pescoço de Cícero.
- Calma, calma – disse o porco – conversando, tudo se
resolve.
Mas o Lobo não queria saber e esbravejou, soprou e bufou, até que chegou Heitor, com uma mala
preta cheia de dinheiro.
Mais calmo, o Lobo argumentou que não podia voltar para a
repartição sem nenhuma autuação.
- Tenho o que você precisa, disse Heitor.
O Lobão submeteu as obras de Prático à uma intensa
fiscalização e encontrou todos as irregularidades possíveis. Impetrou logo umas
vinte multas e uma raposa-repórter amiga do fiscal fez uma longa matéria
denunciando o pobre porco, no Jornal Nacional.
Feliz e com a mala cheia, saiu o lobo pelo bosque,
comemorando o dia gordo. Por ali, passava uma menininha linda, de vestido
xadrez bem curtinho e uma capa vermelha. Ela vendia doces para sobreviver.
Galanteador, o Lobo tenta conquistar a moça e compra logo
todo o cesto de guloseimas. Chapeuzinho
foi o nome que usou. Acostumada com os safados da floresta, marcou um encontro
com o lobo, perto de uma enorme árvore, no alto de uma colina.
Como todo malandro tem seu dia de mané, lá vai o lobo, com
rosas nas mãos, aguardar a menina, sua próxima “refeição”. Notando o atraso, percebe que a fofa passou o
celular errado. Uma pobre velhinha que
atendeu.
Esfomeado, o Lobo não teve dúvidas. Fez uma voz de menininha
abandonada, pegou o endereço da velhinha e partiu pra cima.
Pensionista da previdência do reino, aos 79 anos, passava a
maior parte do tempo nas filas dos hospitais públicos e farmácias populares
daquela terra encantada. O lobo não teve dificuldade nenhuma.
Por ali, passava uma tropa de elite, uma espécie de BOP
medieval, com caçadores armados até os dentes.
Ouviram os gritos e invadiram a
casa. Diante dos sinais de violência constatados, partiram para cima do lobo
para tentar salvar a velhinha.
Mas, com um rápido telefonema, o Lobo acionou o Sistema de
Proteção Ambiental do Reino (SPA). Eles chegaram logo e argumentaram que, mesmo
o Lobo tendo devorado a senhora, era um animal em extinção e deveria ser
preservado.
Foi condenado por homicídio culposo, cometido pelo
descontrole dos próprios instintos. Réu primário, sem antecedentes e com
residência fixa, cumpriu seis meses e foi liberado. Hoje vive confortavelmente
nas Ilhas Maurício.
Sentada em uma sala, cercada de comidinhas engordativas,
estava uma certa formiga, que assistiu toda história em um documentário
completo sobre as aventuras do Lobo mau, transmitido em uma emissora
comunitária. Ficou indignada.
Formiga passou o verão trabalhando muito para ampliar sua
casa e juntar alimentos. Durante aqueles
dias de sol, uma cigarra folgada ficou perambulando entre as tavernas do reino,
enchendo a cara e cantando com aquela voz irritante.
A formiga, vendo o corpo padecer com tanto trabalho, ficou
deprimida e se encheu de remédios, tamanha a inveja que tinha da cigarra de
vida fácil e corpo perfeito. Toda a noite, diante do espelho, não se conformava
com o tamanho dos seus quadris.
De repente, ouviu uma carruagem a buzinar na porta.
- Diga lá, tanajura – mangava a cigarra com voz notadamente
amolecida pelo álcool.
Heitor, o porco-agiota estava nas rédeas da carruagem.
Ainda tentando levar alguma vantagem, a formiga retruca:
- Você que se acha
esperta, aonde vai nesse frio absurdo?
Após uma gargalhada, a cigarra responde:
- Pra Paris, menina. Heitor aqui, comprou um pacote em oito vezes
sem juros e vamos fugir do inverno...
Para humilhar ainda mais, reforça a cigarra:
- Quer alguma coisa de lá ???
Com lágrimas nos olhos e o coração transbordando em raiva, a
formiga responde:
- Quero sim! Manda o La Fontaine pra puta-que-pariu!!!!!!!!!!!
(*) texto inspirado em um original apócrifo que circulou
pela web, sobre a fábula da cigarra e formiga... como sempre achei essas
fábulas esquisitas, não resisti...