sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O quadro que chora....(*)


Teresa se interessa por cores e volumes. Cores fortes e contrastantes. Ela transita entre tons de vermelho, amarelo, azul, roxo e um certo verde, cada vez mais iluminado. Teresa acredita na contemporaneidade colorida e no futuro como maquinista da vida.

Invejo os otimistas como Teresa. O que seria do mundo sem eles, afinal? Acho incrível acreditar no futuro. Pra mim, este cara, o futuro,  é um velho carrancudo aguardando sempre o momento de te ferir. Queria muito conhecê-lo melhor, mas meu assunto é outro...

Teresa investiga e instiga o impulso primeiro do homem, na sua vibração de origem que,  antes de ser mental ou espiritual, é físico e conquista o mundo com sua força. O mesmo impulso que leva as mãos do observador ao contato com o seu mundo.

Quase como no espelho de Alice, eu procuro incessantemente entender o que o homem deixou ao longo da vida e como ele resgata e modifica o que passou. 

O universo de Teresa requer algum tempo para que intrusos sintam-se confortáveis e descansem o olhar. Num primeiro momento, caminhando entre formas e cores, um desavisado pode ter receio daquilo que parece desprender-se das paredes em sua direção.

Mas, esse planeta todo particular fica calmo e aconchegante depois de alguns minutos de imersão. Os volumes pedem o toque e as mãos não resistem... Deslizam por nervos expostos que criam caminhos sem começo nem fim.

Esse labirinto me remete às aulas de pintura  da minha infância e às tardes de mergulhos em tintas e telas que vivi ao lado da minha ruivinha, lambuzando os dedos, móveis e tudo mais.

Caminhando no mundo colorido de Teresa ouvi um gemido num canto escuro. Sim, ali estavam as mesmas cores e formas, entretanto, não havia alegria naquele quadrado. As formas choravam para mim. Literalmente, choravam....

Por piedade, estendi as mãos e toquei a obra que respingou no meu dedo um líquido oleoso, resultado da fusão das cores... Um marrom que o próprio quadro produziu para pintar a parede que lhe restou... Suas lágrimas....

Como os tombos da vida, aquele que ali estava foi uma mistura que tomou outro rumo. Um filho daqueles que, mesmo criado em berço esplêndido, escolhe um caminho obscuro e incomoda, destoa, provoca toda a família.

Um filho que nasceu em 1999.  Ano em que foram engarrafados os melhores vinhos produzidos no Brasil. Minha Luísa se preparava para vir ao mundo. Em março, um grande blecaute deixou 50 milhões de pessoas no escuro. O Plano Real acabou e o câmbio flutuante fez muita gente boiar. Ano de verdades, esse 1999.

Nasceu como seus irmãos de cor e força. Mas encarou a vida sob outro ângulo. Quis pular a janela daquela poesia e encontrou um mundo duro que, a cada dia, teima em destruir sua alegria.

Ahhh esse futuro que Teresa pinta... “Nada pode ser tão colorido assim”, parece nos dizer o pobre chorão, como um palhaço que desmancha a própria maquiagem ou a mulher decadente depois de horas de música e álcool.

Ali, em meio a tanta cor e magia, encontrei algo que já foi futuro e hoje é um passado que se transforma todos os dias. Uma úlcera rompeu sua carne e ameaça destruí-lo aos poucos, cruelmente e sem piedade.

Mas resta-lhe um estranho brilho que o tempo estampa em luz. Algo que lembra o quanto foi bom, mas grita: não há graça no envelhecer! Morremos um pouco a cada dia, ainda que a morte se aproxime com brilho.

Essa intersecção entre nossos mundos, o quadro que chora, roubou meu olhar. No próximo encontro, como eu, como ela, ele também será outro sujeito, com as cores do tempo, os caprichos do espaço, entre o sorriso de Teresa e suas próprias, as nossas,  lágrimas...

(*) O quadro que chora é obra da artista Teresa Viana (www.teresaviana.com.br), amiga querida....

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