A discussão sobre as exposições envolvendo erotismo e nudez, seja no
Sul ou em São Paulo, deixa claro um certo consenso sobre o fato de que o
conteúdo em pauta seria impróprio para crianças – seja na apreciação das obras,
seja na participação da garotada em performances. Estaríamos nós – sociedade
brasileira – como que protegendo nossos pequenos do nu exposto, do sexo
feito arte. Mesmo os que condenam a gritaria liderada pelos meninos do MBL
(Movimento Brasil Livre) abrem parênteses para a ideia de que o assunto é
coisa de gente grande.
Adianto que não faz muito sentido discutir se o que foi apresentado
é arte ou não - como gente de monte que nunca entrou em um museu anda fazendo.
Tô vendo a hora que alguém vai colocar o pênis do Adão de Michelangelo na mesa.
Ou pior: questionar o poder erótico de Nossa Senhora do Leite. Seria a virgem
apropriada à apreciação pública? Amamentar é arte?
O que faz sentido discutir é essa tal de “proteção” às “nossas” crianças. Já que não tenho compromisso com lado nenhum nessa história
me aventuro a meter os dois pés na porteira da hipocrisia. Qual, exatamente
qual, o problema que pode gerar para o desenvolvimento de uma criança uma
pintura erótica ou aquele pobre peladão deitado no chão do MAM???
Você, meu caro leitor, de fato acredita que aquela garotinha
que segurou o pé do artista nu, com sua mãe ao lado, perdeu um minuto de sono
com o que viu? Ou pior: acha mesmo que aquela visão pode provocar, no futuro
dos pequenos, um trauma ou bloqueio sexual diante do pênis mole do sujeito? O
que há de erótico em um Cristo cheio de pés e braços? Ou nos desenhos quase
infantis de gente transando com bichos?
Crianças são influenciáveis sim, claro. Mas não são imbecis.
São expostas à erotização frequente em comerciais de televisão, novelinhas
(rebeldes que o digam), modismos, jogos e revistas e nem por isso saem correndo
em busca de sexo ou tornam-se pervertidas malucas. O tema aliás já foi bem mais
difícil em outros tempos, não é mesmo?
Vivemos anos a fio com dona Xuxa em trajes mínimos e suas
paquitas rebolando nas telas, entupindo a garotada com ofertas de brinquedos e
amaciando a inteligência infantil com músicas idiotas. E tinha Angélica,
Eliana, Mara e outras tantas, cada qual mais exposta e, que fique claro, todas
de carne e osso, diariamente na sala de casa.
E tem a tal da Zoofilia definida como perversão que leva ao
sexo com animais. Tudo por conta de algumas imagens toscas retratadas em um dos
quadros da exposição patrocinada pelo Santander. Pois deixe que seu filhinho
digite esse termo zoofilia no Mr
Google para ver o que aparece logo na primeira página: um show de imagens escatológicas de
gente de verdade transando com bichos. Isso é arte? Pode?
Essa garotada que jamais passou na porta de um museu passa o
dia perdida na internet povoada de pedófilos, zoófilos e outros ófilos que seus
pais jamais imaginaram existir e, para os quais, o MBL convenientemente fecha
os olhos. Afinal, bater em artista é bem mais legal do que enfrentar
criminosos, não é mesmo?
Sem falar da telinha. Os filhos dos queixosos não assistem a
novela das 9? Putaria e bandidagem nos morros cariocas em rede aberta, com
direito a discussão no Faustão parecem liberadas para as inocentes criancinhas,
desde que fiquem longe de museus e seus artistas contemporâneos contaminantes.
Sou pai e lidei com a questão em casa ao longo dos 17 anos
da minha filha. Jamais tratamos a nudez com tintas moralistas e nem a arte como
coisa certa ou errada. Acho que eu e a mãe da minha filha acertamos. Luísa
cresceu em paz com o sexo e com a cultura – sem traumas!!!
É disso que se trata. Do que as crianças recebem em casa, na
escola, dos amigos, enfim do seu conjunto de referências. Educar é um processo
aberto para o mundo e suas coisas. O véu moralista sempre encobre o pior. Já a
naturalidade desperta nas crianças as mais surpreendentes reações.
Uma cena, aliás, ilustra bem o assunto!
Estávamos eu e Luciana assistindo a novela enquanto Luísa, à
época com uns quatro ou cinco anos, brincava com suas bonecas. De repente,
Fábio Assunção enche Malu Mader de beijos que começavam nos pés e iam
subindo libidinosamente pelas pernas da morena, para o nosso constrangimento.
Deveríamos mudar de canal? Ou seria melhor manter e distrair
a pequena para não chamar a atenção?
Luísa então começa a gargalhar!!!!!
Eu e a mãe da criança nos olhamos sem entender aquela reação
esquisita diante da cena tórrida. E perguntamos, lógico, qual o motivo da
risada. Veio a resposta:
- Olha lá!!! Parece que ele não sabe onde é a boca!!!
Pois é...
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